domingo, 16 de janeiro de 2011

A onda sonora do LUZ o ilumina

LUZ era um homem cuja realidade se resumia a batalha para superar "o mundo da ilusão".
Foi assim que LUZ passou a vida toda preso na ilusão de que estar superando a i-lus-ão.
A ilusão de LUZ era a sombria realidade do mundo material. Mesmo encarnado ele vivia a ilusão de vencer a matéria. LUZ não curtia Jesus e jamais poria no carro o adesivo "100% Jesus". Carro até vai. Mas carro com Adesivo é muita matéria para o gosto do Luz. Mas, mesmo sem adesivo, o sonho oculto de LUZ era um dia ser “ 100% LUZ”.
Um ex-amigo bebâdo, sábio e sombrio cruzou com LUZ na rua e disse: "Quer virar luz? De um tiro no ouvido!!!".
Mas LUZ não ouviu esse som. Iludido pela luz, LUZ não ouvia sons oriundos da sombra. Luz na verdade, não ouvia som algum. Quando muito, a própria voz.
É que Luz era muito humilde. Tão humilde que ficou dominado pela arrogância típica das pessoas que se auto-definem humildes. E foi assim que não percebeu a realidade dita pelo sombrio corpo material do sábio ex-amigo bêbado dominado pela ilusão.

LUZ ficou sozinho por muitos e muitos anos. Sozinho e arrogante. Com tristeza galopante, LUZ ficou sombrio.
Até que no auge da escuridão a luz finalmente chegou. E veio na forma de som.
Começou com uma mudança sutil em sua material corda vocal.
Há anos o LUZ falava sozinho. Era uma prática oculta: a busca da retórica perfeita com a oralidade ideal. Ele sabia que a voz é música e a música é a mais espiritual das artes. E quando menos esperava, quando já estava nas profundezas de suas sombras, chegou uma luz. E com ela a grande mudança: a voz de Luz alcançou o exato tom iluminado.
Luz sempre falara pausado. Mas antes seu tom era apenas chato. Agora sua corda vocal, numa mutação iluminadissima, desenvolvera uma técnica que dava a impressão que sua voz vinha de longe. De trás. Do alto. Sublime e avante. A voz de LUZ era etérea. O som de LUZ era um som sagrado.
Mas era apenas uma sutil mudança vibratória em sua material corda vocal.
A voz de LUZ causou impacto. Quando Luz falava, seu corpo era como um boneco de ventríloquo, controlado pela luz do iluminado espírito do LUZ. A voz parecia vir de longe, direto da luz até o som, sem se contaminar pela sombria matéria material. Luz não precisava nem mexer a boca, esse tão carnal aparelho sonoro.
Logo LUZ ganhou adeptos. Quando LUZ falava o seu público - que odiava seus próprios degradados corpinhos materiais - vibrava em silêncio respeitoso. De etéreo balão solitário a flanar na ilusão de criticar ilusoriamente o "mundo da ilusão" material, LUZ finalmente, virou uma luz que ilumina. O sucesso foi tanto que LUZ falava em grandes palcos materiais super iluminados por grandes holofotes materiais, para uma imensa platéia de sombrios corpos humanos materiais encarnados que – a procura da própria iluminação e do próprio desapego da matéria - iam ouvir os sons emitidos por LUZ. Ninguém ligava muito para o conteúdo por trás do som, era o mesmo de sempre. O que colava mesmo era voz do LUZ. Ou como disse um fã mais heavy, ainda em início de conversão: “o cara faz um mega som iluminado”.
E foi assim, emitindo sons iluminados, que o corpinho material de LUZ conseguiu, finalmente, ser feliz na parte sombria da matéria. Está certo que LUZ evitava sorrir, pois “seria carnal demais”. Mas era feliz. Quando ele menos percebeu, estava realmente iluminado. Feliz, pleno.
Combater "o mundo material da ilusão" virou uma realidade material. E LUZ chegou a iluminação devido a sua material corda vocal que emitia uma sonora onda espiritual.
Ou como já disseram em algum lugar sagrado: no princípio era o verbo.


Moral da história
Ilusão que só ilude só, é só ilusão que se ilude só. Mas ilusão que nos ilude junto, é realidade.
Nem se essa ilusão for a ilusão de “combater a ilusão”.

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