sábado, 29 de janeiro de 2011

A primeira vez que eu morri - conto 2

A primeira vez que eu morri foi a mais sofrida.
Eu estava assustado, com medo, pensava que a primeira morte seria a ultima. Nada pior do que achar que existe o ultimo. Por mim, tiraria esse tipo de palavra do vocabulário.
Além disso, eu ainda não me julgava pronto para morrer. Afinal, eu não tinha ficado rico, eu ainda não tinha comido a Juliana Paes (nem nenhuma equivalente), eu ainda estava gordo, eu ainda não tinha tido filhos pois só podia ter filhos após ficar rico, eu ainda não tinha feito meu livro pois só podia fazer meu livro após ficar rico, eu ainda nem plantara uma árvore e não plantaria uma árvore nem após ficar rico.
Portanto, quando saquei que ia realmente morrer eu optei por resistir. Sou brasileiro e não desisto nunca. Rebelde e obsessivo eu iria lutar até o fim. O fim! Sempre ele, me apavorando, me obssedando.
E uma coisa eu posso dizer: o obsessivo é, antes de tudo, um forte.
E quem é forte sofre.
Lutei e lutei cada vez mais sozinho. Minha mãe vinha me consolar falando de vida após a morte. Eu gritei muito com ela, a espantei, a expulsei. Não quero consolo. A morte é injusta. Ainda mais para alguém que ainda nem ficou rico. Não sou homem de trocar o certo pelo duvidoso. Vou lutar para viver aqui em vida. E bla, bla, bla...
Minha mãe tadinha. Ficou muito triste de me ver tão bravo.
Foi muito doído, sofri muito. Só consegui morrer quando pifou meu cerebro, entrei num transe maluco de pesadelo, enlouqueci, não sabia mais o que era sonho o que era real, nem pensava mais nesses termos, e aí consegui passar. Ufa! Mas não tinha ainda passado. Foi uma morte longa, cansativa, obsssessiva, demorada.
A segunda vez que nasci voltei mais pragmático. Não perdi tempo com estudos, diversões ou bobagens em geral. Já voltei no meu foco: enriquecer e comer a Juliana paes da época. Não perdi um segundo. Com trinta anos já estava rico e já tinha comido umas 15 juliana paes da época. Fui um sucesso. Depois não sabia mais o que fazer, continuei enriquecendo, comi mais centenas de Julianas paes da epóca, viciei em cocaína, morri de acidente de carro. Doidaço de ansiedade joguei o carro no poste. Nada me satisfazia. Por mais rico que eu ficasse sempre tinha alguma mulher que não queria dar para mim e algum dinheiro que era dos outros. Morri em protesto contra a vida.
A terceira vez que vivi já nasci meio tristinho. Não tinha mais vontade de ficar rico e percebi que não tinha como superar a morte. Virei filosofo sem livro publicado. Só pensava na morte e na inutilidade da vida. Passei a vida toda pensando que a vida não tinha sentido. E nem senti a vida passar. Não resisti para morrer, nem morri em protesto. Apenas me deixei morrer. Mas, na hora da morte, quando pensei que nada tinha sentido, eu curti a vida. Estava com febre alta, me deram uns remedios loucos e relaxei. Peguei um transe legal e curti minha passagem. Pela primeira vez eu sai de mim e tive um daqueles flash backs rememorativos. Tinha passado a vida ensimesmado em mim mesmo, mas na hora da morte revi vários momentos, percebi o sorriso de minha mae me olhando no berço, um momento poético de mau humor de meu pai (um fofo aquele coroa), uma professora da universidade meio gordinha me paquerando que nem reparei pois estava pensava na inutilidade da vida..Sei lá, mas de repente eu vi um monte de coisinha bonita que eu não tinha visto. Foi um presente. E não fiquei triste por não ter aproveitado. Apenas me senti um mané. Percebi bons momentos que tive e morri feliz de ver que a vida, no fundo, no fundo, podia ser gostosinha. Pela primeira vez desencarnei com leveza.
Foi uma morte ótima, cheia de esperança, sem o bruximo que me incomodou tanto em outras mortes, dormindo o sono dos justos, sonhando em voltar logo para a vida, para curtir todos os momentos, quem sabe plantar uma arvore, quem sabe publicar um livro, quem sabe gastar uma boa grana num ótimo jantar, quem sabe comer a Juliana paes da época com mais carinho e atenção e, quem sabe até, comer e casar com a professorinha gordinha de filosofia que me paquerar na próxima vida. Foi uma morte super gostosa.
E finalmente eu nasci feliz. Já cheguei curtindo a vida. Saquei que o negocio mesmo é agradecer o tempo todo. Se agradecer em todos momentos da vida, vai morrer tranquilo, mega agradecido, até já cansado de tanto agradecer. E percebi que para quem esta vivo o que vier já é lucro.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

A primeira vez que eu morri

A primeira vez que eu morri foi a mais dramática.
Um belo tiro na boca, miolos espatifados colados no teto, carta de despedida “perdoando” a famíla para deixar todos culpados, tudo que eu tinha direito.
Inicialmente, meu plano parecia ter dado certo. Minha melodramática construção cenica da morte despertar o interesse do público. Eu aumentara meu IBOPE e por alguns dias fui o protagonista do filme multiplot de minha escola e família. Vendo tudo do alto, eu era feliz e até sabia. Exceto pela dor no queixo (mesmo sem ter corpo , eu sentia uma ligeira dor no queixo) eu vivia o filme que planejara e curtia a felicidade sádica dos grandes vingadores. Felicidade sádica? Bem... No fundo, no fundo, eu era infeliz e não sabia.
Mas como não sabia eu ainda era um homem sadicamente feliz. Homem? Bem sei lá. Eu era sadicamente feliz.
Mas aconteceu algo que eu não esperava: logo me esqueceram. Foi só chegar o carnaval que todos cairam no samba. Foi horrivel. Eu ali, de negro, tentando assombrar meus amigos que me ignoraravam e ex-namoradas que me abandonaram e eles todos vibrando alegria. Nunca me senti tão impotente. Nada é pior para um fantasma do que ser ignorada. É a morte. Até meu pai, que sempre foi ausente em minha vida, continuou ausente em minha morte. Apenas minha mãe sofria. Mas justo ela que sem pre me amou e não merecia isso. De repente me senti culpado e a dor que eu sentia no queixo subiu para toda cabeça e chegou ao peito. Meu coração chorava ao ver minha mãe chorando.
(Uma dica: quando for se suicidar escolha bem a data. Eu sei que você esta num transe interior, mas mesmo assim é importante saber dialogar com o mundo exterior. Afinal o suicídio é um evento externo a você. É o momento aonde seu drama interior é revelado ao mundo. É a estreia de seu melodrama de não aceitação. Por isso, tal como a estreia de um filme, você tem que escolher bem a data para não sofrer concorrências inusitadas. Um exemplo: nada de véspera de carnaval, melhor quarta feira de cinzas.)
Sofri muito até reencarnar. Reencarnei em um buraco qualquer, passei 3 vidas escolhendo famílias depressivas, mãe suicida, pai enlouquecido e empregos de funcionario público em repartição. Só para ir limpando. Foram varias encarnações melancólicas, sozinho, tentando aclamar a mim mesmo. E depois mais umas 4 encarnações vivendo perto de minha antiga mãe, tentando controlar o nervosismo e histeria dela, mostrar que estava tudo bem
Eu nem entendia muito bem, porque reencarnar, não conseguia ter forças para nada, mas também, não reclamava. Apenas vivia.
Dificil mesmo foi recuperar o prazer de viver. Agora, só hoje, eu pela primeira vezes em seculos, reparei em um flor. Era linda, amarela, e suas petalas vibravam ao vendo. Não sei como nem porque, mas logo a seguir, reparei numa menina. Depois na grama, depois no vento, depois em tudo. Não sei como mas pela primeira vez eu lembrei qual é a graça de viver. E a graça é olhar o mundo e agradecer a deus por estar vivo.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A goleada da vida

Estou cada vez mais convencido: a consciência e a presença da morte é fundamental para aproveitar bem a vida!
Um único exemplo: imagina se toda vez que eu fosse falar eu tratasse essa fala com a importância das "últimas palavras". Não falaria mais bobagem nunca.

O perigo de pensar na morte é você ficar ansioso e querer aproveitar a vida. Aí fica tudo muito tenso. Isso acontece no inicio, nos primeiros momentos da sua real consciência da morte.

Mas com o tempo a ansiedade passa.

Pois ao pensar sempre na morte você começa a perceber algo fantástico: na grande maioria dos momentos da vida, NA GRANDE MAIORIA MESMO, você NÃO morre!

Você só morrerá por um segundinho. E lá na frente. Até o momento a vida esta ganhando esse jogo. E de goleada.

Aí você vai ficando tranqüilo. Pensar na morte faz voce perceber a vitoria da vida.
Até na hora h, mesmo na hora da morte, você é mais tolerante com a dita cuja. Poxa, afinal o seu time (a vida) esta ganhando de goleada. Que que tem ela fazer um golzinho?
Assim, com a consciência da vitória da vida sobre a morte é que você supera a ansiedade chata de "aproveitar a vida". Mas continua valorizando cada instante dela.

Mas, ao invés de gastar energia em tudo, começarás a escolher mais. Escolher com quem estar, o que falar, o que fazer. Isso é ser um sábio. Deve ser isso a tal da iluminação.

Resumindo: você só chega a iluminação através da consciência da morte. Aliás, o que é a meditação além de uma morte em vida? E xamanismo é ritual de passagem.

É tudo para a gente lembrar da morte, perceber a vitoria da vida e com isso ficar mais tranquilo.

domingo, 23 de janeiro de 2011

A igualdade dos aereo-portos

De tanto viajar ficou sem porto. E meio aereo. So se sentia em casa num único lugar: no aereo-porto.
Em meio a tantas cidades diferentes apenas a permanente igualdade entre os aeroportos o consolava. Era a igualdade em meio a diferença.

Um taxista elitista

Ainda nao sei como tem gente que gosta do Lula.
Ninguem ve o que ele fez com o Brasil?
Veja so meu caso, trabalho de taxista do aerporto.
Antes so pintava gente fina em meu taxi. Era todo mundo limpo e educado. Cada viagem era um novo aprendizado, eu tinha orgulho de meu trabalho.
Agora pinta cada pobre que nem lhe digo. Parece rodoviaria do tiete. So faltou nordestino viajando com gaiola de galinha, o resto tudo eu ja vi. Nao tem condicao.
O problema e que pobre nao tem responsabilidade. Gasta tudo que ganha. E só voce deixar ele classe media que ele gasta tudo.
Ai acontece isso tudo. Caos aereo, por exemplo. Foi por conta disso. Muito pobre pegando voo.
E o transito entao?
veja o caos que esta agora?
Culpa de quem? Do Lula. Quem mandou facilitar o credito de carro zero? Agora aguenta.
Agora esta tudo assim. Um caos. Ate o clube eles invadiram. Sou palmeirense antigo, de familia. Tive que parar de ir no clube. Chegou gente nao sei daonde, parece ate que estou no Corinthians. Nem um clube limpo a gente tem direito.
A praia entao nem pensar. Ha dez anos atras eu deixei a praia grande pois ela corinthianizou, chegou a zona leste em peso. Comprei uma kit em peruibe. Mas eles logo chegaram la tambem. Estou tentando agora comprar em Ubatuba, mas ja nem sei se adianta. Eu compro a peso de ouro, mas os pobre logo chegam e tudo que eu invisto desvaloriza. Antiguidade nao tem valor na era lula.
Ate mesmo Parati foi invadida. Zona leste dominou. Da dó de ver o patrimonio histórico dilapidado pelos incultos.
Tambem o que e que a gente ia esperar. Bem que meu pai avisou que isso de migracao ia acabar dando merda. Comecou com os hospitais. Os caras migravam para SP, ficavam doente e invadiam nossos hospitais. Assim nao tem imposto que chegue. Nem o saudoso prefeito Maluf conseguia resolver. Bem que ele tentava, mas era só ele criar um hospital que chegava uma nova leva de nordestinos. Eu nao sou necessariamente contra a migracao. Se o cara quer arriscar vir para ca , e direito dele. Mas nao tem sentido ele usar o hospital que foi construido com os impostos pagos pelos paulistas verdadeiros. Se nordestino ficar doente, tem que extraditar para o estado dele. Basico.
Mas nos fomos deixando. Nao agimos nos anos 70, nem nos 80. Náo deu outra. O cara virou presidente e abriu o mundo de vez.
Agora eles invadiram total.
Nao sei mais se tem jeito
Nao tem mais para aonde ir.

domingo, 16 de janeiro de 2011

tudo muda. Menos vanguarda

Como todo cineasta de van-guarda ele odiava o Van-Damme.Apesar dele também ser Van. E de ser guarda.
Seu auge foi no dia em que, premiado no Festival, foi aplaudido na van por seus amigos da guarda. Era uma van a Diesel. Uma van-Diesel
Seus amigos da guarda eram como ele: dedicavam a vida a fazer a guarda. Guarda do que? Do exato conceito de van-guarda.
Mesmo fazendo guarda ele não era de todo cão e nem sempre dizia não. E além de gostar de vans e de amar a guarda ele tambem gostava do Van Diesel*.
Mas não contava isso para seus amigos da guarda que andavam com ele nas vans. Mesmo sabendo que as van eram a diesel. Eram vans-diesel.
Mas foi tudo em vão. Cinema no Brasil é assim: não tem chão. E além do mais, "é tão díficil conseguir captação". Toda sua guarda foi em vão. Foi uma vã-guarda.
Hoje, Ele, quando muito, fica em casa. Ali. Sentado. Vendo televisão.
Nunca mais sequer andou de van. Mas , ao menos, nunca mais ficou na guarda.
Agora feliz, Ele brinca com seu filho. E longe da guarda admite que gosta do Van. Do Van Diesel.
E seu filho outro dia confessou. Ele gosta do Van. Do VAn Damme.
E tal com o pai seu filho vai ser, um dia, um cineasta. Mas não será cine-astro. E não vai ser de vã-guarda.


obs:
*vin diesel é o nome correto. Mas tem gente que pronuncia van. Então dei uma adaptada par funcionar a piada.

A onda sonora do LUZ o ilumina

LUZ era um homem cuja realidade se resumia a batalha para superar "o mundo da ilusão".
Foi assim que LUZ passou a vida toda preso na ilusão de que estar superando a i-lus-ão.
A ilusão de LUZ era a sombria realidade do mundo material. Mesmo encarnado ele vivia a ilusão de vencer a matéria. LUZ não curtia Jesus e jamais poria no carro o adesivo "100% Jesus". Carro até vai. Mas carro com Adesivo é muita matéria para o gosto do Luz. Mas, mesmo sem adesivo, o sonho oculto de LUZ era um dia ser “ 100% LUZ”.
Um ex-amigo bebâdo, sábio e sombrio cruzou com LUZ na rua e disse: "Quer virar luz? De um tiro no ouvido!!!".
Mas LUZ não ouviu esse som. Iludido pela luz, LUZ não ouvia sons oriundos da sombra. Luz na verdade, não ouvia som algum. Quando muito, a própria voz.
É que Luz era muito humilde. Tão humilde que ficou dominado pela arrogância típica das pessoas que se auto-definem humildes. E foi assim que não percebeu a realidade dita pelo sombrio corpo material do sábio ex-amigo bêbado dominado pela ilusão.

LUZ ficou sozinho por muitos e muitos anos. Sozinho e arrogante. Com tristeza galopante, LUZ ficou sombrio.
Até que no auge da escuridão a luz finalmente chegou. E veio na forma de som.
Começou com uma mudança sutil em sua material corda vocal.
Há anos o LUZ falava sozinho. Era uma prática oculta: a busca da retórica perfeita com a oralidade ideal. Ele sabia que a voz é música e a música é a mais espiritual das artes. E quando menos esperava, quando já estava nas profundezas de suas sombras, chegou uma luz. E com ela a grande mudança: a voz de Luz alcançou o exato tom iluminado.
Luz sempre falara pausado. Mas antes seu tom era apenas chato. Agora sua corda vocal, numa mutação iluminadissima, desenvolvera uma técnica que dava a impressão que sua voz vinha de longe. De trás. Do alto. Sublime e avante. A voz de LUZ era etérea. O som de LUZ era um som sagrado.
Mas era apenas uma sutil mudança vibratória em sua material corda vocal.
A voz de LUZ causou impacto. Quando Luz falava, seu corpo era como um boneco de ventríloquo, controlado pela luz do iluminado espírito do LUZ. A voz parecia vir de longe, direto da luz até o som, sem se contaminar pela sombria matéria material. Luz não precisava nem mexer a boca, esse tão carnal aparelho sonoro.
Logo LUZ ganhou adeptos. Quando LUZ falava o seu público - que odiava seus próprios degradados corpinhos materiais - vibrava em silêncio respeitoso. De etéreo balão solitário a flanar na ilusão de criticar ilusoriamente o "mundo da ilusão" material, LUZ finalmente, virou uma luz que ilumina. O sucesso foi tanto que LUZ falava em grandes palcos materiais super iluminados por grandes holofotes materiais, para uma imensa platéia de sombrios corpos humanos materiais encarnados que – a procura da própria iluminação e do próprio desapego da matéria - iam ouvir os sons emitidos por LUZ. Ninguém ligava muito para o conteúdo por trás do som, era o mesmo de sempre. O que colava mesmo era voz do LUZ. Ou como disse um fã mais heavy, ainda em início de conversão: “o cara faz um mega som iluminado”.
E foi assim, emitindo sons iluminados, que o corpinho material de LUZ conseguiu, finalmente, ser feliz na parte sombria da matéria. Está certo que LUZ evitava sorrir, pois “seria carnal demais”. Mas era feliz. Quando ele menos percebeu, estava realmente iluminado. Feliz, pleno.
Combater "o mundo material da ilusão" virou uma realidade material. E LUZ chegou a iluminação devido a sua material corda vocal que emitia uma sonora onda espiritual.
Ou como já disseram em algum lugar sagrado: no princípio era o verbo.


Moral da história
Ilusão que só ilude só, é só ilusão que se ilude só. Mas ilusão que nos ilude junto, é realidade.
Nem se essa ilusão for a ilusão de “combater a ilusão”.